Neblina, altitude, modelo da aeronave: especialistas comentam queda de avião em Gramado

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A queda de uma aeronave no centro de Gramado (RS), na manhã desse domingo (22), deixou 10 mortos de uma mesma família, além de feridos nas proximidades do acidente. As conclusões só serão definidas após a investigação do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), da Aeronáutica, mas especialistas destacam fatores relevantes, especialmente as condições meteorológicas ruins na cidade, com muita neblina.

Somado à alta nebulosidade, está o fato do aeroporto de Canela não dispor de equipamentos que permitiriam o chamado “voo por instrumentos”, quando o avião é orientado com base nos instrumentos de bordo, em vez de referências visuais externas. Portanto, o piloto, ao decolar daquele aeroporto, precisava fazer um “voo por visual”, o que demanda visibilidade limpa. Por isso, é necessário investigar as exatas condições meteorológicas daquele momento. Imagens divulgadas exibem um cenário com muitas nuvens.

Os especialistas ouvidos pelo jornal O Globo destacaram que o modelo da aeronave, Piper PA-42 1000 Cheyenne, é bastante seguro e sua fabricante, a Piper, é uma das maiores fabricantes do mundo. Outra hipótese para o acidente surgiu após relatos de testemunhas no local de que sentiram cheiro de querosene, tipo de combustível que não é usado naquele avião.

Um abastecimento equivocado pode inviabilizar o funcionamento do motor. Ao mesmo tempo, Rolland de Souza, piloto e Coordenador da pós-graduação em medicina aeroespacial da Escola Superior do Ar, ponderou que não é simples uma pessoa leiga diferenciar o cheiro entre querosene e a gasolina para aviação.

Condições climáticas

As imagens já divulgadas do momento em que a aeronave decolou mostram um cenário de nebulosidade em Canela, de onde o voo partiu. Gerardo Portela, doutor em Gerenciamento de Riscos e Segurança pela UFRJ, está coincidentemente em Gramado, onde houve a queda. Em entrevista à Globonews ele afirmou que o dia era de “visibilidade mínima”.

“Diria que, com minha experiência, há entre 100 e 150 metros de visibilidade, em solo. Nessas condições, não é possível fazer um voo visual, precisaria fazer um voo por instrumento ou do suporte do aeroporto para isso. A condição climática é forte indicador para acidente como esse”, disse o especialista, que acrescentou que o piloto tem a responsabilidade de planejar o voo com base nos boletins meteorológicos. “Mas a condição pode mudar até o momento da decolagem. Mas se percebe na hora do voo que não há mais visibilidade, ele deveria desistir. Se o piloto fica numa nuvem, sem visão de horizonte, sem noção de altitude, pode perder a consciência situacional, como se tivesse andando no escuro. Isso pode ter acontecido.”

Rolland de Souza diz que, pelos vídeos, a neblina parecia “relativamente espessa” no aeroporto.

“Não causa invisibilidade total, mas é causa uma invisibilidade parcial até considerável. Então pensamos na hipótese de desorientação espacial do piloto, pois as referências visuais estariam prejudicadas”, explica o piloto, que também é médico. “Sabemos que raramente um acidente é causado por apenas um fator. Em 99,99%, são causados por cadeia de eventos. Tem que pegar o fio da meada, para saber onde começou o erro.”

Aeroporto

O aeroporto de Canela é homologado pela Infraero, mas é de pequeno porte, e somente voos visuais são realizados. Quando um aeroporto opera por instrumento, é porque ele possui procedimentos de subida e descida, com equipamentos instalados, para que a aeronave consiga sair e chegar com segurança, sem depender de referências visuais para decolagem e pouso. Nesses casos, são realizados mapeamentos do entorno do aeroporto, com margem de segurança.

Os instrumentos podem ser coordenadas geográficas para GPS, homologadas pela FAB, ou sinalizações no chão e antenas com sinais de radiofrequência.

Gerardo Portela destacou a limitação do aeroporto de Canela.

“Numa condição climática como essa fica mais difícil ainda. A condição climática não era das melhores, e equipamento tem suas limitações. A maior responsabilidade é obviamente do piloto, já que o aeródromo é extremamente limitado.”

Altitude baixa 

O acidente aconteceu apenas três minutos após a decolagem, em um local a poucos quilômetros do aeroporto de Canela. Por isso, a pane certamente ocorreu logo depois da decolagem, dizem os especialistas. Isso explicaria o fato de o avião estar em uma baixa altitude no momento do acidente. A colisão teria sido em uma chaminé de um prédio em uma das avenidas mais movimentadas de Gramado.

“A baixa altitude era normal, porque tinha acabado de decolar, então ainda estava ganhando altitude e velocidade. Nós pilotos sabemos que o momento mais crítico do voo é a decolagem, porque ainda está com baixa altitude, baixa velocidade e com a aeronave vencendo a inércia”, afirma Rolland de Souza. “Para ter decolado de Canela e caído logo em Gramado, em uma distância de 6, 7 quilômetros, é porque a pane ocorreu logo após a decolagem.”

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