Brasil entrega resposta ao governo Trump, defende o Pix, a soberania do Supremo, e diz que não adota práticas desleais no comércio

O governo brasileiro protocolou nesta segunda-feira (18) sua resposta oficial ao Escritório do Representante Comercial dos Estados Unidos (USTR, na sigla em inglês) na investigação aberta sob a Seção 301 da Lei de Comércio de 1974.
No documento, o Brasil afirma que não adota políticas discriminatórias, injustificáveis ou restritivas ao comércio com os EUA e que não há base jurídica ou factual para a imposição de sanções.
A apuração foi iniciada em julho, a pedido do governo do presidente Donald Trump, que alega que políticas brasileiras prejudicam empresas norte-americanas em áreas como sistemas de pagamento digital (Pix), etanol, propriedade intelectual e políticas ambientais relacionadas ao desmatamento.
Em sua resposta, o Brasil listou uma explicação para cada tópico da acusação dos Estados Unidos e pede “diálogo construtivo”.
“O Brasil insta o USTR a reconsiderar o início desta investigação e a iniciar um diálogo construtivo. Medidas unilaterais previstas na Seção 301 podem comprometer o sistema multilateral de comércio e ter consequências adversas para as relações bilaterais”, escreveu o governo brasileiro.
Caso o órgão EUA conclua que há práticas desleais, o governo Trump poderá impor mais sobretaxas a produtos brasileiros.
A ação do governo nos EUA ocorre no contexto do tarifaço de 50% imposto por Trump a uma série de produtos brasileiros, praticamente inviabilizando as exportações desses itens.
Ao anunciar o tarifaço, Trump criticou decisões do Supremo Tribunal Federal do Brasil: o processo contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (aliado do presidente dos EUA) por tentativa de golpe de Estado; e medidas para adequar as empresas de redes sociais (norte-americanas) à lei brasileira.
O Brasil viu motivações ideológicas no tarifaço de Trump, mas decidiu não retaliar e manter negociações.
Argumento geral do Brasil
Na manifestação enviada ao USTR, o Itamaraty defendeu que o comércio bilateral é mutuamente benéfico e que os Estados Unidos registram superávit histórico na relação. O Brasil também ressaltou que promoveu reformas em setores apontados pelos EUA e que todas são compatíveis com normas multilaterais.
“Não há prejuízo às empresas norte-americanas em comparação com companhias de outros países”, diz o texto. Para o governo brasileiro, medidas unilaterais como sobretaxas seriam ilegítimas e contrárias às regras da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Pix
Sobre o Pix, a defesa destacou que as regras de operação do sistema visam segurança, estabilidade e proteção do consumidor, sem restrições discriminatórias a empresas estrangeiras. Já em relação à propriedade intelectual, o Brasil sustentou que cumpre padrões internacionais e mantém marcos regulatórios em linha com os acordos da OMC.
Na defesa do Pix, o governo destacou que o sistema ampliou a participação dos brasileiros no sistema bancário e foi elogiado por entidades como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O documento também destaca que o Pix ampliou a concorrência no mercado de pagamentos eletrônicos, o que levou a um aumento na participação de empresas privadas no tema, incluindo companhias americanas.
O governo brasileiro também destacou que outros países têm adotado iniciativas que se assemelham ao Pix, como a União Europeia, a Índia e mesmo os Estados Unidos. Segundo o documento, um sistema chamado FedNow, oferecido pelo banco central americano, “oferece funcionalidades semelhantes ao PIX”.
STF
O governo afirma que nenhuma decisão do STF ou ordem judicial relacionada ao tema resulta em medidas discriminatórias que prejudiquem os direitos fundamentais de qualquer parte ou a capacidade de empresas norte-americanas competirem no Brasil ou no mercado global.
“Em resumo, nenhuma das alegações em relação à decisão do STF ou às ordens judiciais subjacentes resulta em medidas discriminatórias que afetem de forma indevida os direitos fundamentais de qualquer parte ou a capacidade das empresas norte-americanas de participar competitivamente nos mercados brasileiro ou global.”
O Brasil reforçou que o uso de multas e medidas coercitivas para garantir o cumprimento da lei é uma prática judicial padrão em qualquer país com Estado de Direito, inclusive nos Estados Unidos.
O documento destaca que é prática normal que legislações nacionais estabeleçam requisitos formais para o funcionamento de empresas estrangeiras em seu território, visando questões de responsabilidade jurídica.
O processo segue em análise pelo USTR. Uma audiência pública está marcada para 3 de setembro, quando representantes de empresas, entidades e governos poderão apresentar argumentos adicionais. Até lá, a pressão política deve continuar a crescer, com risco de novas tensões no comércio bilateral.
Fonte: O Sul